Numa
altura em que muitos países “namoram” a possibilidade de serem aceites como
membros do agrupamento BRICS, o novo presidente da Argentina disse não ao
convite endereçado pelo grupo de economias consideradas emergentes. Três dias
antes da data prevista para adesão ao agrupamento, Javier Milei anunciou
formalmente que o seu país não mais se juntaria ao BRICS. Paradoxalmente, na
carta enviada aos líderes do BRICS, Milei propôs “intensificar os laços
bilaterais” e aumentar “os fluxos comerciais e de investimento” sem se juntar
ao grupo. A proposta de Milei é paradoxal porque durante a campanha eleitoral
para sua eleição, o novo presidente havia prometido que não manteria relações
diplomáticas com países comunistas como o Brasil e a China.
Apesar
de aparentar ser um agrupamento apetecível para muitos países considerados em
desenvolvimento, o BRICS acaba de sofrer a sua primeira baixa. A Argentina, que
em Agosto de 2023 tinha sido anunciada, juntamente com a Arábia Saudita,
Emirados Árabes Unidos, Egipto, Etiópia e Irão, como parte dos novos
integrantes do BRICS, descartou a adesão ao grupo. A decisão de desistência
surge pela subida ao poder de um novo presidente, Javier Milei, que ao longo da
campanha eleitoral já havia anunciado que procuraria um maior alinhamento com o
que chamou de “nações livres do Ocidente”, como Israel e os EUA.
BRICS
é um termo, em inglês, cunhado a partir das letras iniciais de cinco países, nomeadamente
Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. É um grupo de países
diferenciados mas que têm algo em comum: a oposição às tendências hegemónicas
dos EUA-Ocidente, que tem dominado a ordem económica internacional, e a
rejeição ao que consideram tentativa de “ingerência” ocidental nos assuntos
internos de outros países. O grupo começou por ser constituído, em 2009, pelos
primeiros quatro países. No entanto, talvez procurando ser mais inclusivo em
termos continentais, a África do Sul foi convidada a aderir em 2010. A Índia
(1), a China (2), o Brasil (7) e a Rússia (9) fazem parte do top 10 dos países
mais populosos do mundo, mas também com maior massa territorial, ocupando
respectivamente as posições 3, 7, 5 e 1. Os cinco países, juntos, são
detentores de cerca de 25% do PIB mundial, 30% da massa territorial, mais de
40% da população e constituem, portanto, o maior mercado consumidor.
As
características anunciadas no parágrafo anterior tornam o BRICS num agrupamento
apetecível para muitos países considerados em desenvolvimento se tornarem
membros. Durante a cimeira de Agosto de 2023 foi anunciado que cerca de 22
países haviam submetido formalmente a sua intenção de se tornarem membros do
fórum BRICS. Foi igualmente anunciado que mais de duas dezenas de outros países
têm estado a solicitar, informalmente, a possibilidade de serem aceites como
membros de pleno direito. Apesar das muitas solicitações, no fim daquela
cimeira o BRICS decidiu se expandir convidando seis candidatos para integrarem
o grupo – a Arábia Saudita, a Argentina, o Egipto, os Emirados Árabes Unidos, a
Etiópia e o Irão.
Sucede,
no entanto, que quando a Argentina foi convidada, e aceitou, a integrar o
grupo, o país estava num ano eleitoral. O vencedor das eleições presidenciais,
o novo presidente Javier Milei, declarou ao longo da sua campanha que não só
estaria alinhado com o Ocidente, como também prometeu que cortaria relações
diplomáticas com países comunistas, numa referência ao vizinho Brasil e à
China. O anúncio do não à adesão ao BRICS é, portanto, um cumprimento e
descumprimento de duas promessas eleitorais. Milei cumpre, por um lado, a
promessa de estar mais alinhado ao Ocidente ao distanciar-se do BRICS, um grupo
que procura uma multipolaridade inclusiva distanciando-se do Ocidente ou
criando um espaço alternativo a ele.
O
novo presidente argentino descumpre, por outro lado, a promessa eleitoral de
cortar relações diplomáticas com os países comunistas, ao ter anunciado que vai
procurar “intensificar os laços bilaterais” e aumentar “os fluxos comerciais e
de investimento” com os membros do BRICS. Tal como o seu antecessor Alberto
Fernández, Milei deve se ter apercebido que não pode cortar relações com os
“comunistas”, pois manter relações com eles é uma oportunidade para alcançar
novos mercados. É só lembrar que o BRICS representa actualmente cerca de 40% da
população mundial e mais de um quarto do PIB mundial. Milei deve ter “caído na
real” de que o Brasil e a China, que durante a campanha eleitoral chamava
pejorativamente de comunistas, são na verdade os dois maiores parceiros
comerciais do país e que, por isso, não tem como cortar relações diplomáticas
com eles.
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