quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Israel Legaliza a “Discriminação à Moda do Nazismo e do Apartheid”


Num mundo em que se defendem os direitos das minorias, o governo israelita aprovou uma lei que considera que 25% (perto de dois milhões) dos seus cidadãos não são nacionais do Estado de Israel. O país possui pouco menos de 9 milhões de habitantes, 75% dos quais judeus, 21% árabes e 4% de outras pequenas minorias. A controversa lei foi aprovada em Julho pelo Knesset (parlamento israelita), mas alguns partidos da oposição e as diferentes minorias contestam-na, por considerarem que a mesma se equipara às leis de estratificação étnica e racial que caracterizaram a Alemanha do período Nazi e a África do Sul do Apartheid.

A tentativa de ver legitimada a histórica Palestina (parte dela hoje Israel) como terra (ou Estado) do povo judeu já vem desde o período do nacionalismo judaico (sionismo). Já em 1922, pouco depois da incorporação da Declaração Balfour ao mandato britânico sobre a Palestina, o líder Sionista, Chaim Weizman, havia anunciado que pretendia “tornar a Palestina tão Judaica como a Inglaterra é Inglesa”. A resultante escalada de animosidades entre as comunidades árabe e judaica da Palestina levou a Grã-Bretanha a publicar um “Livro Branco” que rejeitava as intenções dos judeus.

Nas duas décadas seguintes a potência mandatária procurou equilíbrio entre as intenções de os judeus possuírem um Estado próprio sem prejudicar os direitos dos árabes e outras etnias da Palestina. A própria resolução 181 das Nações Unidas (1947), que possibilitou o estabelecimento do Estado de Israel, criava salvaguardas para a defesa dos direitos das minorias em cada um dos Estados a serem criados. Aliás, na Declaração da Independência de Israel existe uma cláusula que advoga a “igualdade dos direitos sociais e políticos de todos os habitantes independentemente da sua religião, raça ou sexo”.

A aprovação da lei vai contra normas internacionais de não discriminação e confirma as suspeitas dos críticos de que Israel não está interessado em viver em paz com os palestinianos. Três ilações podem ser retiradas em torno da aprovação da lei. Primeiro, a lei dá argumentos válidos àqueles que acusam os judeus de estar a instaurar um regime com características do nazismo e do apartheid. Ao considerar que Israel é a “nação-Estado do povo judeu”, a lei estipula basicamente que os judeus são “superiores” a qualquer outro grupo étnico e religioso do país. Isto é ainda confirmado com a revogação do estatuto do árabe como língua oficial.

Segundo, a relação entre os judeus e os árabes pode deteriorar-se ainda mais. Por um lado, 21% da população israelita é árabe mas se considera cidadã do Estado. Nessa base, procurou sempre viver em harmonia com os seus concidadãos judeus. A retirada do seu estatuto de cidadãos, ou transformação para cidadãos de segunda categoria, pode levar estes a tomar atitudes de muitos árabes que vivem na Palestina. Ou seja, poderão abraçar o sentimento radical de que Israel é a única raiz da situação caótica que os palestinianos vivem e, com isso, tornarem-se “presas fáceis” aos discursos de islamitas radicais que advogam a necessidade da destruição do Estado de Israel.

Por outro lado, a lei pode ser uma arma poderosa a ser usada pelos palestinianos para, primeiro, ganhar simpatias da comunidade internacional e, segundo, para os grupos radicais intensificarem seus ataques com apoio de eventuais árabes israelitas descontentes. Neste cenário, portanto, Israel arrisca-se a colocar em causa a sua própria segurança.

Uma última análise que se pode fazer é em torno das razões da aprovação da lei pela coligação governamental. Aliás, partidos judeus da oposição parlamentar, como o de Tzipi Livni, mostravam-se favoráveis ao dispositivo, mas insistiam que se devia acrescentar o comprometimento à “igualdade de todos os cidadãos”. Na visão da oposição, se a lei previsse isso, os resultados da votação não seriam tão apertados como foram. Porém, aqui se encontra o cerne da possível razão que levou à intransigência do governo de Netanyahu. Por estar-se a aproximar o período de eleições, ao governo interessava mesmo que a lei fosse aprovada pelos deputados da coligação governamental e rejeitada pela oposição. Desse modo, os partidos governantes ficam, aos olhos dos cidadãos, como aqueles que realmente se preocupam em defender os interesses dos judeus.

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