sábado, 6 de abril de 2024

África do Sul ganha a primeira batalha, conseguirá “vencer a guerra” contra Israel?

Parte do objectivo primário que precipitou a instauração, pela África do Sul, de um processo contra Israel no Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) foi alcançado com algum sucesso. Embora não tenha anuído ao “pedido urgente” de Pretória para que se ordene que Israel suspenda a sua ofensiva militar nos territórios palestinianos, o tribunal das Nações Unidas ordenou um conjunto de medidas que, se cumpridas por Israel, podem minimizar a carnificina que está a ocorrer em Gaza. O TIJ tomou uma posição intermédia que, ao que parece, “satisfaz” parcialmente as duas partes desavindas. Por um lado, o Tribunal emitiu um conjunto de medidas que Israel deve observar, que a serem cumpridas vão limitar a margem de manobra de Tel Aviv continuar a sua ofensiva militar em Gaza. Por outro lado, o Tribunal não concede ao pedido de Pretória para ordenar um cessar-fogo imediato, o que significa que Israel tem permissão para continuar com a sua ofensiva militar. Com a primeira batalha ganha parcialmente, a África do Sul deve agora concentrar-se em tentar “vencer a difícil guerra” de provar em tribunal que, efectivamente, Israel cometeu o crime de genocídio na sua guerra contra os palestinianos em Gaza.

Há duas semanas a África do Sul intentou, junto do TIJ, uma acusação contra Israel por supostos crimes de genocídio cometidos na campanha militar israelita em resposta ao ataque terrorista do Hamas em Outubro de 2023. A acusação sul-africana estava fundamentada em cinco argumentos que se enquadram na definição de genocídio: o assassinato em massa de palestinianos em Gaza; a imposição de graves danos mentais e corporais por Israel ao povo de Gaza; o deslocamento forçado e bloqueio alimentar contra a população; a destruição do sistema de saúde; e o impedimento de nascimento de palestinianos. Israel havia tentado rebater estes argumentos sustentando que as suas operações militares enquadravam-se no contexto do direito de autodefesa; que a acusação de genocídio era circunstancial; que o Hamas é que devia ser responsabilizado po supostamente usar civis como escudos humanos; que TIJ não tinha jurisdição para se pronunciar sobre o caso; e que não havia fundamentos para sustentar a acusação de Israel impedir o fornecimento de ajuda humanitária.

O tribunal das Nações Unidas chegou a um veredicto na semana passada, pelo menos em termos da emissão de “medidas provisórias” solicitadas por Pretória. A esmagadora maioria dos juízes do TIJ, 15 de um total de 17, parece ter concordado com a maior parte dos argumentos apresentados pela África do Sul e, portanto, o tribunal ordenou um conjunto de medidas provisórias enquanto continuam as diligências de averiguação. Aliás, o tribunal notou que existem evidências suficientes de disputa que justificam a continuação da investigação dos alegados casos de genocídio cometidos por Israel. Sobre a jurisdição do Tribunal, que Israel contestava, o TIJ não só concluiu que pode decidir sobre o assunto, como também indicou que pode, e fez isso, ordenar medidas provisórias.

Essencialmente, o Tribunal ordenou que Israel tome medidas para prevenir actos de genocídio enquanto trava a sua guerra contra o grupo Hamas na Faixa de Gaza, ao mesmo tempo que deve punir qualquer incitamento ao genocídio. Num prazo de um mês, Israel foi ordenado a informar o Tribunal sobre o que está a fazer para cumprir a ordem de tomar todas as medidas ao seu alcance para prevenir actos de genocídio em Gaza. De igual modo, o Tribunal decidiu que Israel deve implementar prontamente medidas “imediatas e eficazes” para garantir a entrega de ajuda humanitária e serviços básicos urgentemente necessários a Gaza.

Apesar da África do Sul ter ganho, parcialmente, esta primeira batalha, a sua “vitória” inicial é ensombrada por uma medida que Pretória solicitou mas que o Tribunal não deu provimento: as medidas provisórias não impõem o cessar-fogo. Duas razões podem ter estado por detrás da não ordenação do cessar-fogo, uma positiva e outra negativa. Na razão positiva, pode ser que os juízes tenham dado provimento ao argumento israelita de as suas operações militares se enquadrarem no direito de autodefesa. Tendo em conta que o Hamas foi o primeiro a infiltrar-se no território israelita, pode ser que os juízes vejam a retaliação como uma acção legítima desde que, como as medidas provisórias prescrevem, o direito de autodefesa não desemboque em genocídio de palestinianos. A razão negativa colocaria nas lições do passado. Depois do início das operações militares da Rússia na Ucrânia, em 2022, o TIJ ordenou um cessar-fogo imediato. No entanto, a Rússia ignorou a ordem e continuou a sua campanha militar. Pode ser que os juízes do Tribunal não queiram passar pelo mesmo “embaraço” de tomar uma decisão em que o visado simplesmente ignora. Aliás, as autoridades israelitas sempre deixaram claro que as operações militares iriam continuar até o alcance dos objectivos traçados.

As medidas provisórias emitidas pelo Tribunal dão à diplomacia sul-africana algum nível de vitória moral, e até legal, já que o TIJ deu provimento à necessidade de continuação de investigações sobre o possível cometimento de genocídio por Israel. No entanto, antevêem-se “duros” tempos, pois a África do Sul terá de convencer os juízes o Tribunal para tentar “vencer a difícil guerra” de provar que, efectivamente, Israel cometeu o crime de genocídio na sua guerra contra os palestinianos em Gaza. 

Ucrânia “bloqueia” controlo de armamento pelas grandes potências

 

Há dois anos do fim do acordo que impõe restrições ao desenvolvimento, à produção, ao armazenamento, à proliferação e ao uso de armas nucleares, o chamado Novo START, as duas maiores potências nucleares, EUA e Rússia, continuam desavindas e parece não haver vontade de o renegociar. Na semana passada, o ministro dos negócios estrangeiros da Rússia, Sergei Lavrov, rejeitou publicamente uma proposta norte-americana para que as duas potências reiniciem o diálogo sobre o controlo de armamento nuclear. A “culpada” pelo “não ao diálogo nuclear” da Rússia é a Ucrânia, embora este país seja vítima da invasão russa. Por um lado, Washington diz estar interessado em reiniciar o diálogo nuclear, para o qual considera que não se deve fazer colação à guerra na Ucrânia. Moscovo, por outro lado, atesta que o diálogo nuclear não pode ser separado da guerra na Ucrânia, pelo que condiciona o reinício do diálogo ao fim do apoio de Washington à Ucrânia. Ao que tudo indica, a Ucrânia vai continuar a “bloquear” a possibilidade de as duas maiores potências nucleares alcançarem algum entendimento em torno do controlo de armas, o que traz o risco de se assistir a uma nova corrida ao armamento nuclear.

Controlo de armamento é um termo usado para fazer referência a restrições internacionais ao desenvolvimento, produção, armazenamento, proliferação e uso de armas pequenas, armas convencionais e armas de destruição em massa. O conceito implica alguma forma de colaboração entre Estados geralmente competitivos ou antagónicos em áreas de política militar para diminuir a probabilidade de guerra ou, caso a guerra ocorra, para limitar o seu nível de destruição. Durante a ocidentalmente designada guerra fria, com o aparecimento da dimensão nuclear das armas e o risco de destruição mútua, os EUA e a então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas decidiram iniciar negociações para, primeiro, limitar os testes, depois a implantação e, finalmente, a posse de armas nucleares. Foi nesse contexto que foi criada, em 1957, a Agência Internacional de Energia Atómica, cuja missão é promover a utilização pacífica da tecnologia nuclear e impedir a sua utilização para fins militares.

Ao longo do tempo vários acordos de controlo de armamento foram assinados, sendo que o último significativo, o chamado Novo START, foi assinado em 2010 com a duração esperada até 2026. O Novo START, uma sigla inglesa para Tratado de Redução de Armas Estratégicas[1], veio substituir o Tratado de Moscovo (SORT)[2], que expiraria em 2012, no seguimento do START I, que expirou em 2009, do proposto START II, que nunca entrou em vigor, e do START III, cujas negociações não chegaram a ser concluídas. O tratado prevê a redução pela metade do número de lançadores de mísseis nucleares estratégicos e a instauração de um novo regime de inspecção e verificação, em substituição do mecanismo SORT. Em Fevereiro de 2023, basicamente um ano após a invasão da Ucrânia, a Rússia suspendeu a sua participação no tratado.

É esse mecanismo de controlo de armamento que Washington diz estar interessado que se reinicie a negociação e que Sergei Lavrov retorquiu, na semana passada, dizendo que o seu país não está interessado. Na verdade, o “não” de Moscovo não parece reflectir uma negação da ideia de controlo de armamento. Ele parece reflectir, sim, uma percepção, por parte das autoridades de Moscovo, de que a anunciada vontade negocial de Washington não passa de uma manobra para poder ter acesso às instalações nucleares, por meio das inspecções mútuas que acarretam os acordos de controlo de armamento, da Rússia. Aliás, quando Putin anunciou a suspensão da participação do seu país no acordo, o presidente russo reiterou que a Rússia não se retirava do acordo mas que não permitiria que se fizessem inspecções às suas instalações nucleares.

A “culpada” pelo desentendimento nuclear entre Washington e Moscovo é a Ucrânia. Washington quer alcançar dois objectivos aparentemente incompatíveis. Os EUA se posicionam como apoiantes “incondicionais” de Kiev na sua tentativa de retirar as tropas russas do seu território, ao mesmo tempo que desejam chegar a um entendimento com a Rússia sobre o controlo de armamento nuclear. Estes dois objectivos parecem irreconciliáveis, pois o apoio dos EUA à Ucrânia é visto como uma ameaça à segurança e aos interesses da Rússia, facto que impede, a priori, qualquer possibilidade de entendimento nuclear entre as duas grandes potências. Aliás, dificilmente os EUA e a Rússia poderão chegar a um entendimento nuclear enquanto Moscovo considerar que Washington está a travar uma “guerra híbrida” contra si. O apoio à Ucrânia e os contínuos discursos ocidentais de que este país está cada vez mais perto do braço armado dos EUA-Ocidente, a Organização do Tratado do Atlântico Norte, colocam cada vez mais distante a possibilidade de reinício do diálogo nuclear. Tal como disse Lavrov, “no meio de uma ‘guerra híbrida’ travada por Washington contra a Rússia, não vemos qualquer base, não apenas para quaisquer medidas conjuntas adicionais na esfera do controlo de armas e redução de riscos estratégicos, mas para qualquer discussão de questões de estabilidade estratégica com os EUA”. Isto significa que enquanto o apoio dos EUA-Ocidente à Ucrânia prevalecer, o diálogo para o controlo de armamento nuclear parece que vai permanecer bloqueado. Ou seja, a Ucrânia “bloqueia” controlo de armamento pelas grandes potências.



[1] Strategic Arms Reduction Treaty

[2] Tratado sobre Reduções de Ofensiva Estratégica (Treaty on Strategic Offensive Reductions)

Julgamento de Israel – a inglória tarefa à frente dos juízes do Tribunal de Haia

Estão lançados os “dados”! A África do Sul apresentou, semana passada, os seus argumentos para sustentar a acusação que intentou junto do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) contra Israel por supostos crimes de genocídio. Israel, por sua vez, expôs os seus contra-argumentos para tentar rebater a acusação. A “bola” está agora do lado dos juízes do TIJ, que podem levar anos para tomar uma decisão final, que devem provavelmente se pronunciar nas próximas semanas ao “pedido urgente” de Pretória para que se ordene que Israel suspenda a sua ofensiva militar nos territórios palestinianos. Os juízes do tribunal enfrentam, agora, uma tarefa difícil, inglória, pois qualquer decisão que tomarem em relação ao “pedido urgente” parece que vai reforçar a ideia de que as organizações internacionais continuam a ser “fauna acompanhante” dos Estados nas relações internacionais.

O caso submetido ao TIJ pela África do Sul foi despoletado pela mais recente fase do “eterno” conflito israelo-palestiniano. Em Outubro de 2023 o Hamas fez uma incursão terrorista no território de Israel que vitimou mais 1200 pessoas e raptou algumas centenas. Em retaliação, Israel iniciou uma campanha de bombardeamento indiscriminado na Faixa de Gaza que já matou mais de 23000. A “desproporcionalidade” da resposta israelita levou a uma onda de solidariedade internacional para com os palestinianos e a pedidos de suspensão das operações militares que só não encontram eco no Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU), onde Israel tem aliados de peso que continuam a patrocinar as suas operações contra os palestinianos.

Percebendo que do CSNU não se pode esperar uma decisão que imponha a cessação das hostilidades em Gaza, a África do Sul optou por recorrer ao TIJ, o tribunal máximo das Nações Unidas sediado em Haia, na Holanda. Naquele Tribunal, a África do Sul alega que o Estado de Israel cometeu, e está a cometer genocídio contra os palestinianos na Faixa de Gaza, em violação da Convenção sobre o Genocídio, de 1948. Pela Convenção, o crime de genocídio é definido como “qualquer um dos cinco actos cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso”. Os actos tipificados na Convenção são os de “matar membros de um grupo protegido; causar-lhes graves danos corporais ou mentais; impor condições de vida destinadas a destruir o grupo; impedir nascimentos; e transferir à força crianças para fora do grupo protegido.

A apresentação da África do Sul coloca as acusações no que descreve como o contexto mais amplo da conduta de Israel em relação aos palestinianos, incluindo o que descreveu como um apartheid de 75 anos, uma ocupação beligerante de 56 anos e um bloqueio de 16 anos da Faixa de Gaza. Essencialmente, a acusação da África do Sul está fundamentada em cinco argumentos para sustentar a tese de crime de genocídio, nomeadamente: o assassinato em massa de palestinianos em Gaza; a imposição de graves danos mentais e corporais por Israel ao povo de Gaza; o deslocamento forçado e bloqueio alimentar contra a população; a destruição do sistema de saúde; e o impedimento de nascimento de palestinianos.

Como era de esperar, Israel refuta as acusações da África do Sul e na sua argumentação a defesa de Tel Aviv refere que Pretória “distorceu” e “descontextualizou” as acções militares de Israel em Gaza, e que ao acusar o país judeu de genocídio, Pretória estava a “diluir” o significado do crime. Essencialmente, a defesa de Tel Aviv refere que as suas operações militares enquadram-se no contexto do direito de autodefesa; que as acusações de que Tel Aviv tem uma intenção inerente de “destruir” (intenção genocida) o povo palestiniano baseiam-se em “afirmações circunstanciais”; respondendo às alegações de acções genocidas reais, incluindo assassinatos em massa e indiscriminados de civis, os advogados de Israel alegaram que o Hamas estava a usar civis como escudos humanos e que as tropas israelitas estavam a tentar “minimizar” os danos civis; que em termos de procedimentos pode ser que o tribunal não tenha jurisdição para se pronunciar sobre o caso; e que as alegações de que Israel está a bloquear alimentos, água, combustível e outros fornecimentos críticos de Gaza são “imprecisas”.

Os “dados” estão lançados. Cabe agora aos juízes do TIJ decidir o que vem a seguir, e isso talvez venha a ocorrer nas próximas semanas. Seja como for, os juízes enfrentam uma tarefa difícil e inglória, porque qualquer decisão que tomarem, pelo menos em relação ao “pedido urgente” de ordenar a cessação das operações militares israelitas em Gaza, vai ser considerada parcial e com o alto risco de descredibilizar a actuação das instituições internacionais na resolução de diferendos entre actores de relações internacionais.

Se, por um lado, o TIJ não ordenar a suspensão da ofensiva militar israelita, o tribunal arrisca-se a ser descredibilizado por inacção em face da evidente matança em massa que está a ocorrer nos territórios palestinianos. É o mesmo que dizer que o órgão das Nações Unidas se posiciona do lado daqueles que perpetram actos genocidas sob capa de combate ao terrorismo. Aliás, para além das acções no teatro de operações, que têm ceifado milhares de vidas de palestinianos e destruíram bairros, senão cidades, inteiros, já se ouviram vozes de figuras de topo da governação israelita a defenderem o deslocamento forçado de palestinianos, uma linguagem que parece enquadrar-se no crime de genocídio. Ao não dar provimento ao pedido de Pretória ficará a ideia de que o Tribunal terá sucumbido à pressão de Tel Aviv, e seus aliados, para não agir.

Se, por outro lado, o TIJ dar provimento ao pedido da África do Sul e decidir por ordenar a suspensão da ofensiva militar israelita, o Tribunal arrisca-se também a confirmar a ideia de que as organizações internacionais continuam a ser “fauna acompanhante” dos Estados nas relações internacionais. É verdade que as decisões do Tribunal Internacional de Justiça, o mais alto tribunal da ONU, são definitivas e não são passíveis de recurso. O grande problema é que o Tribunal não tem como fazer cumprir as suas decisões. Ele depende dos Estados para eventualmente poderem formar alguma força, seja de intervenção ou de pacificação, para fazer cumprir as suas decisões. Isso significa que Israel, em face de uma decisão contrária, e pelos aliados de peso que possui, pode simplesmente ignorar o tribunal e continuar a sua ofensiva. Ainda assim, se o Tribunal tomar uma decisão contra Israel, isso poderá prejudicar a reputação internacional do país e abrir um precedente legal para casos futuros. Mas isso não vai ilibar o Tribunal da mancha de que as organizações internacionais funcionam como “fauna acompanhante” dos Estados.

Argentina fora do BRICS – Milei cumpre e descumpre promessa de campanha

 

Numa altura em que muitos países “namoram” a possibilidade de serem aceites como membros do agrupamento BRICS, o novo presidente da Argentina disse não ao convite endereçado pelo grupo de economias consideradas emergentes. Três dias antes da data prevista para adesão ao agrupamento, Javier Milei anunciou formalmente que o seu país não mais se juntaria ao BRICS. Paradoxalmente, na carta enviada aos líderes do BRICS, Milei propôs “intensificar os laços bilaterais” e aumentar “os fluxos comerciais e de investimento” sem se juntar ao grupo. A proposta de Milei é paradoxal porque durante a campanha eleitoral para sua eleição, o novo presidente havia prometido que não manteria relações diplomáticas com países comunistas como o Brasil e a China.

Apesar de aparentar ser um agrupamento apetecível para muitos países considerados em desenvolvimento, o BRICS acaba de sofrer a sua primeira baixa. A Argentina, que em Agosto de 2023 tinha sido anunciada, juntamente com a Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egipto, Etiópia e Irão, como parte dos novos integrantes do BRICS, descartou a adesão ao grupo. A decisão de desistência surge pela subida ao poder de um novo presidente, Javier Milei, que ao longo da campanha eleitoral já havia anunciado que procuraria um maior alinhamento com o que chamou de “nações livres do Ocidente”, como Israel e os EUA.

BRICS é um termo, em inglês, cunhado a partir das letras iniciais de cinco países, nomeadamente Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. É um grupo de países diferenciados mas que têm algo em comum: a oposição às tendências hegemónicas dos EUA-Ocidente, que tem dominado a ordem económica internacional, e a rejeição ao que consideram tentativa de “ingerência” ocidental nos assuntos internos de outros países. O grupo começou por ser constituído, em 2009, pelos primeiros quatro países. No entanto, talvez procurando ser mais inclusivo em termos continentais, a África do Sul foi convidada a aderir em 2010. A Índia (1), a China (2), o Brasil (7) e a Rússia (9) fazem parte do top 10 dos países mais populosos do mundo, mas também com maior massa territorial, ocupando respectivamente as posições 3, 7, 5 e 1. Os cinco países, juntos, são detentores de cerca de 25% do PIB mundial, 30% da massa territorial, mais de 40% da população e constituem, portanto, o maior mercado consumidor.

As características anunciadas no parágrafo anterior tornam o BRICS num agrupamento apetecível para muitos países considerados em desenvolvimento se tornarem membros. Durante a cimeira de Agosto de 2023 foi anunciado que cerca de 22 países haviam submetido formalmente a sua intenção de se tornarem membros do fórum BRICS. Foi igualmente anunciado que mais de duas dezenas de outros países têm estado a solicitar, informalmente, a possibilidade de serem aceites como membros de pleno direito. Apesar das muitas solicitações, no fim daquela cimeira o BRICS decidiu se expandir convidando seis candidatos para integrarem o grupo – a Arábia Saudita, a Argentina, o Egipto, os Emirados Árabes Unidos, a Etiópia e o Irão.

Sucede, no entanto, que quando a Argentina foi convidada, e aceitou, a integrar o grupo, o país estava num ano eleitoral. O vencedor das eleições presidenciais, o novo presidente Javier Milei, declarou ao longo da sua campanha que não só estaria alinhado com o Ocidente, como também prometeu que cortaria relações diplomáticas com países comunistas, numa referência ao vizinho Brasil e à China. O anúncio do não à adesão ao BRICS é, portanto, um cumprimento e descumprimento de duas promessas eleitorais. Milei cumpre, por um lado, a promessa de estar mais alinhado ao Ocidente ao distanciar-se do BRICS, um grupo que procura uma multipolaridade inclusiva distanciando-se do Ocidente ou criando um espaço alternativo a ele.

O novo presidente argentino descumpre, por outro lado, a promessa eleitoral de cortar relações diplomáticas com os países comunistas, ao ter anunciado que vai procurar “intensificar os laços bilaterais” e aumentar “os fluxos comerciais e de investimento” com os membros do BRICS. Tal como o seu antecessor Alberto Fernández, Milei deve se ter apercebido que não pode cortar relações com os “comunistas”, pois manter relações com eles é uma oportunidade para alcançar novos mercados. É só lembrar que o BRICS representa actualmente cerca de 40% da população mundial e mais de um quarto do PIB mundial. Milei deve ter “caído na real” de que o Brasil e a China, que durante a campanha eleitoral chamava pejorativamente de comunistas, são na verdade os dois maiores parceiros comerciais do país e que, por isso, não tem como cortar relações diplomáticas com eles.

sexta-feira, 7 de agosto de 2020

Os “pecados capitais” do plano de paz de Donald Trump

O presidente dos EUA anunciou, recentemente, o seu tão esperado plano de paz para pôr termo ao conflito israelo-palestiniano. Aclamado por uns e desdenhado por outros, o plano de Trump traz consigo, à partida, alguns pecados capitais. Quando se olha para o comportamento das partes, as causas da longa conflitualidade e a forma como o plano foi apresentado, pode dizer-se que o plano de paz trumpiano está condenado à morte antes mesmo do início da sua implementação.

Basicamente, o plano proposto pelo presidente dos EUA preserva a ideia da criação de dois Estados: um para os Judeus (já criado em 1948) e um para os Árabes (ainda por criar) na Palestina. Na verdade, esta solução foi esboçada pelas Nações Unidas, quando esta organização aprovou, em 1947, a Resolução 181, e foi reforçada por várias resoluções subsequentes, com destaque para a Resolução 242 do Conselho de Segurança (em 1967), aprovadas no contexto do conflito israelo-árabe/palestiniano. O plano de Trump propõe também que Jerusalém seja considerada “capital indivisível” de Israel e que os territórios ocupados por este país, diga-se ilegalmente, na Cisjordânia sejam “legalizados”, para além de exigir o reconhecimento do Vale do Jordão como de soberania israelita. Em benefício dos palestinianos os EUA prometem biliões de dólares em investimento, que podem gerar milhares de empregos e promover o desenvolvimento da Palestina.

Um dos modelos mais simples para a análise de conflitos identifica quatro elementos básicos sobre os quais o analista deve basear-se para compreender um determinado conflito, ou então as tentativas de sua resolução. São eles o contexto, as partes, as causas e a dinâmica do conflito. Para efeitos da análise que se pretende neste artigo interessam apenas as partes e as causas, pois a sua complexidade faz prever maior resistência dos palestinianos em relação ao plano.

Quando se fala de partes, são identificáveis três tipos: as primárias (donos do conflito), as secundárias (apoiantes dos donos do conflito) e as terciárias (terceiros que tentam ajudar as partes primárias a pôr termo ao conflito). Este espaço não é suficiente para, com detalhes, identificar e descrever as partes do conflito. No entanto, é óbvio dizer que as partes primárias do conflito israelo-palestiniano são o Estado de Israel e a Palestina. No geral e numa análise simplificada, pode-se dizer que os Estados árabes são os apoiantes da Palestina e, do lado de Israel, os EUA têm se mostrado como seu apoiante “incondicional”. Como parte terciária, ainda que muitos actores possam reunir condições para essa categoria, identificamos aqui as Nações Unidas.

O primeiro pecado capital do plano de Trump reside no comportamento da parte secundária EUA. Desde a eclosão do conflito israelo-árabe/palestiniano os EUA têm desempenhado um papel duplo. Se, por um lado, se assumem como apoiantes incondicionais de Israel, endossando a maioria das, senão todas, iniciativas israelitas em relação à Palestina, o que a torna parte secundária, por outro, procuram liderar os esforços tendentes a pôr-se fim ao conflito, o que a tornaria uma parte terciária. Este papel dúbio dos EUA torna-se “pecado capital” para qualquer iniciativa de paz deste país pela sua dificuldade em separar as duas posições. Aliás, a forma como o plano de Donald Trump foi anunciado, com a presença e sorriso cúmplice do primeiro-ministro de Israel e sem nenhuma representação dos palestinianos, denuncia a dubiosidade e o favorecimento que a administração norte-americana faz a uma das partes primárias ignorando a outra.

O segundo pecado do plano está no conteúdo da proposta, que na verdade reflecte alguns dos pontos mais sensíveis do conflito, isto é, os factores que causam a perpetuação da contenda. Das questões mais sensíveis no conflito pode-se destacar o território, ou fronteiras, Jerusalém e os refugiados. Sobre o território, o plano de partilha de 1947 colocava a Faixa de Gaza e a Cisjordânia como os espaços onde se estabeleceria o Estado palestiniano. Na primeira guerra Israel amealhou mais território do que o previsto em 1947 e muita gente fugiu, ou foi expulsa, facto que originou a problemática dos refugiados. Na guerra de 1967 Israel ocupou a Faixa de Gaza e a Cisjordânia, mas a Resolução 242, que impôs o cessar-fogo, exigiu a devolução dos territórios ocupados. No processo de paz lançado na década de 1990 os palestinianos recuperaram a Faixa de Gaza, mas os israelitas continuaram a ocupar a Cisjordânia. O plano de Trump pretende que a ocupação israelita, materializada pelos colonatos, seja legalizada.

No plano de partilha, Jerusalém, dada a sua sensibilidade, ficaria sob gestão internacional. Porém, nas várias guerras travadas, Israel ocupou-a e considera-a sua capital, apesar da “resistência da comunidade internacional”. Mas os palestinianos também consideram Jerusalém como capital do seu futuro Estado. O plano de Trump peca “capitalmente” por considerar que esta cidade seja considerada “capital indivisível” do Estado de Israel. Aliás, o plano parece contraditório quando sugere a indivisibilidade de Jerusalém ao mesmo tempo que refere que parte da cidade, a Oriental, seja capital da Palestina.

Quando há guerras é natural que muita gente se desloque dentro do seu próprio país ou se refugie em outros países. Terminada a guerra, é também natural que as pessoas regressem às suas zonas de origem, ou às suas casas. Na primeira guerra israelo-árabe milhares de palestinianos se refugiaram nos países vizinhos. No fim da guerra, as autoridades israelitas, que ocuparam o território previsto para o Estado palestiniano, não permitiram o regresso dos refugiados. O plano de partilha peca igualmente por não abordar as reivindicações palestinianas sobre o direito ao retorno.

Um último pecado capital que se pode abordar neste artigo é a excessiva confiança trumpiana de que os dólares resolvem tudo. As propostas de alienação das vontades dos palestinianos baseiam-se na crença de que a promessa de investimento na criação de empregos e desenvolvimento é suficiente para os palestinianos aceitarem o plano. Porém, nos estudos de conflito existem alguns aspectos, as necessidades e os valores, que não são passíveis de “venda”. Aliás, numa rara concordância de posições, as diferentes facções palestinianas, com destaque para a Autoridade Palestiniana e o Hamas, já vieram a público rejeitar peremptoriamente o plano. Outros pecados capitais podem ser identificados, especialmente ligados ao timing da sua publicação, mas essa é matéria para uma outra reflexão.

 


Estará Trump a tentar redefinir as fronteiras dos Estados do Médio Oriente?

Nos seus habituais comentários nas redes sociais, na passada quinta-feira o presidente dos EUA, Donald Trump, mostrou mais uma vez que não tem apreço ao direito internacional ou às decisões da Organização das Nações Unidas. Talvez acreditando no potencial de reduzir a influência do Irão no Médio Oriente, o presidente norte-americano “pontapeou” as normas internacionais e sugeriu que é chegado o momento de o seu país reconhecer a soberania israelita sobre os Montes Golã. Trump justifica a sua sugestão alegando a relevância estratégica e securitária que os montes Golã representam para Israel e para a estabilidade da região do Médio Oriente. Após decidir mudar a embaixada dos EUA de Tel Aviv para Jerusalém, o seu recente anúncio mostra o seu desdém em relação ao direito internacional quando se trata de “proteger” seus aliados ou tentar punir seus inimigos. Porém, a efectivar-se essa intenção, o Estado de Israel arrisca-se a enfrentar uma cada vez maior oposição à sua existência no Médio Oriente.

Pela Resolução 181, de 1947, Jerusalém, dado o seu valor simbólico, ou religioso, tanto para os árabes como para os judeus, devia estar sob administração internacional. Ou seja, nenhum dos dois Estados (um para os árabes e outro para os judeus) a serem criados, na altura, devia reivindicar o território de Jerusalém como seu. Porém, com o estabelecimento do Estado de Israel em 1948 e a consequente eclosão do conflito israelo-árabe/palestiniano, o controlo de Jerusalém tem sido motivo de tensão entre Israel e os Estados árabes. Aliás, na primeira guerra israelo-árabe, Jerusalém chegou a ser dividida, em termos de ocupação, entre Israel e a Transjordânia (hoje Jordânia).

Após várias guerras entre Israel e os Estados árabes, as Nações Unidas procuraram sempre manter o estatuto de Jerusalém como um território internacional. Com isso, a maior organização mundial refutava a reivindicação israelita, mas também palestiniana, sobre a soberania sobre Jerusalém, de tal modo que a capital israelita reconhecida foi sempre Tel Aviv. Por essa razão, a ONU sempre recomendou, e quase todos Estados do mundo assim agiram, que as representações diplomáticas dos Estados em Israel tivessem a sua sede em Tel Aviv. Porém, ao ascender à Casa Branca, Trump desfez essa prática diplomática ao anunciar a transferência da embaixada do seu país para Jerusalém. Tal decisão, criticada pela comunidade internacional por violar o direito internacional, parece não ter sido um caso isolado da política externa da actual maior potência mundial. O executivo norte-americano parece mesmo estar interessado em redefinir as fronteiras dos Estados do Médio Oriente.

A recente sugestão de que os Montes Golã devem ser reconhecidos como parte do território de Israel é mais uma demonstração de que na defesa dos seus aliados os EUA estão dispostos a violar o direito internacional. Pelas fronteiras (artificiais) traçadas após o término da Primeira Guerra Mundial, os Montes Golã foram reconhecidos como território soberano da Síria. Porém, no decurso da terceira guerra israelo-árabe em Junho de 1967, também conhecida como Guerra dos Seis Dias, Israel ocupou a maior parte dos Montes Golã e decidiu anexá-los efectivamente em 1981. Contudo, a comunidade internacional nunca reconheceu tal anexação. Aliás, a Resolução 242 das Nações Unidas, que pôs fim à Guerra dos Seis Dias, estatuía claramente a proibição da aquisição de território por via da guerra e impunha a obrigatoriedade de as partes beligerantes retirarem-se dos territórios ocupados. 

Embora aplaudida pela liderança israelita, a decisão de Trump tem o potencial de criar uma maior oposição ao Estado de Israel na região do Médio Oriente. A existência em si do Estado de Israel não tem sido acolhida de bom grado pelos árabes. O reconhecimento dos EUA da ocupação de mais território árabe por Israel pode unir ainda mais os árabes na sua luta contra Israel. Aliás, é preciso lembrar que o Hezbollah, do Líbano, é um grupo que surgiu em oposição ao território libanês ocupado por Israel após a invasão deste último ao primeiro em 1982. Com efeito, ainda que haja divergências nos diferentes grupos sírios que lutam pelo derrube do regime de Assad, a defesa do território sírio pode ser um elemento de unificação contra a ameaça israelita. Ao invés de garantir a segurança do Estado de Israel, o reconhecimento da soberania israelita sobre os Montes Golã, que à luz do direito internacional pertencem à Síria, pode fazer (re)emergir os sentimentos anti-israelitas na região e alimentar mais grupos radicais que podem ameaçar a segurança daquele Estado. Portanto, ao invés de estabilidade regional, o eventual reconhecimento pode aumentar ainda mais o nível de instabilidade que o Médio Oriente vive.


Artigo publicado no Jornal Domingo. Disponivel em https://www.jornaldomingo.co.mz/index.php/arquivo/15-internacional/11702-estara-trump-a-tentar-redefinir-as-fronteiras-dos-estados-do-medio-oriente

sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Os Acordos de Oslo – a “colonização” israelita da Palestina

Quando Yasser Arafat, líder da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) e da Autoridade Palestiniana até a sua morte em 2004, assinou os acordos de Oslo II, em Setembro de 1995, estava convencido que a criação do Estado palestiniano estava para breve. Porém, passam 23 anos e o estabelecimento do Estado palestiniano continua uma miragem. Os críticos já haviam alertado sobre os perigos da assinatura daquele compromisso, mas o optimismo do líder da OLP vincou. Tal como temiam os críticos, com o acordo Israel garantiu a legalização da “colonização” sobre a Cisjordânia e consolidou a sua presença no território. A isso se adiciona o facto de as acções da “parte terciária” ao conflito, os EUA, serem favoráveis à manutenção da “colonização” judaica sobre a Palestina.

O conflito israelo-árabe teve o seu início em 1948, quando os judeus declararam o estabelecimento do Estado de Israel a 14 de Maio e, no dia seguinte, forças de cinco países Árabes invadiram o recém-estabelecido Estado. Desde a formação de Israel foram travadas quatro guerras israelo-árabes até 1973. Depois da derrota árabe de 1967 e da assinatura dos Acordos de Camp David em 1978/9, o conflito ficou mais direccionado para a dimensão israelo-palestiniana. Em Setembro de 1993, o governo israelita e a OLP assinaram o que ficou conhecido como Acordos de Oslo, corporizados pelo reconhecimento mútuo e pela Declaração de Princípios.

Na Declaração de Princípios acordou-se a retirada Israelita de Gaza e Jericó; o estabelecimento de uma força policial Palestiniana para a segurança interna; eleições para uma Autoridade Palestiniana; a transferência da autoridade para os Palestinianos em relação à educação e cultura, saúde, bem-estar social, impostos directos e turismo; a realização de negociações sobre o status final, que iniciariam em dois anos, e o alcance do acordo final em cinco anos. Dois anos mais tarde assina-se o Oslo II, também conhecido como Acordo de Taba, Segunda Fase ou Acordo Interino.

Oslo II estabeleceu zonas de controlo, na Cisjordânia, para os Palestinianos e Israelitas. A Zona A (3%) seria controlada pelos palestinianos; a Zona B (24%) teria controlo conjunto israelo-palestiniano; a Zona C (73%) sob controlo israelita. Na interpretação do acordo, Yasser Arafat acreditava que tanto a zona B como a Zona C em breve passariam para o controlo exclusivo palestiniano e, com isso, estabelecer-se-ia o Estado. Por seu turno, Yitzhak Rabin congratulava-se por ter conseguido um acordo que garantia ao Estado Judeu a “colonização” (controlo) de 73% do território, 80% da água e 97% dos arranjos de segurança. Aliás, Israel conseguiu que a OLP reconhecesse o seu direito de existência mas, em contrapartida, Israel reconheceu a OLP como representante do povo palestiniano mas não reconhece o direito da existência da Palestina como Estado independente e soberano.

No presente mês de Setembro, que hoje termina, passam 23 anos desde a assinatura de Oslo II. Porém, o almejado Estado continua uma miragem. Tal como tinham previsto os críticos palestinianos ao acordo, os relatos referem que a liberdade de passagem entre as cidades e vilas foi substituída por postos de controlo e recolheres obrigatórios; a autonomia reduziu a liberdade; as Zonas A e B parecem ilhas de autonomia Palestiniana cercadas pelo controlo israelita. Enquanto isso, os colonatos judaicos interligam-se por estradas que permitem aos colonos uma livre mobilidade. Ou seja, Oslo II permitiu a legalização e consolidação da “colonização” Israelita sobre os territórios palestinianos.

Em resultado da “colonização” israelita, vários grupos palestinianos, com destaque para o Hamas, ganharam notoriedade nos territórios ocupados. Em 2006 este grupo venceu as eleições em Gaza, numa altura em que, aparentemente, Israel dava sinais de pretender retirar-se dos territórios. A ascensão do Hamas, rotulado como grupo terrorista, levou ao recrudescimento de ataques de ambos os lados da fronteira, numa espiral de violência da qual parece não haver fim a vista. 

Desde os meados da década de 1970 os EUA posicionaram-se como a potência com a capacidade para desempenhar o papel de “parte terciária”. Porém, os vários governos deste país não conseguiram ajudar as partes a alcançarem a paz. O governo de Trump, particularmente, não parece estar interessado em ver uma Palestina independente. Aliás, desde que tomou posse, o governo de Trump tem minado o processo de paz: reconheceu a sensível Jerusalém como capital de Israel; retirou o financiamento à UNRWA (Agência das Nações Unidas para a Assistência aos Refugiados da Palestina); e há algumas semanas anunciou o cancelamento da missão diplomática palestiniana em Washington. Portanto, de uma posição de “parte terciária”, que se esperaria ser neutra, os EUA agem como uma “parte secundária”, tomando posição favorável à “colonização” israelita da Palestina.



Artigo publicado no Jornal Domingo. Disponível em http://www.jornaldomingo.co.mz/index.php/internacional/10831-acordos-de-oslo-a-colonizacao-israelita-a-palestina