domingo, 9 de setembro de 2018

Os Milhões de Dólares da China para África – Presente Envenenado?


Terminou, no passado dia 4 de Setembro, a Cimeira China-África em que os chineses mais uma vez predispuseram-se a “gastar” vários milhões de dólares em África. O que as lideranças africanas vêm como uma bênção para ultrapassar os problemas de subdesenvolvimento, os críticos, particularmente do Ocidente, alertam que as investidas chinesas em África carregam consigo uma espécie de “presente envenenado”. Esta natural discordância entre os apoiantes e os retartadários da presença da China em África pode ser lida sob três prismas: o das lideranças africanas e seus apoiantes; o dos retartadários da expansão do poder da China na economia política global; e o dos cautelosos.

No prisma das lideranças africanas o aumento da “bondade” chinesa é um alívio em relação às “complicadas” relações com os tradicionais parceiros do Ocidente. Enquanto os ocidentais querem “intrometer-se” nos assuntos internos dos Estados africanos ao conceder empréstimos, os chineses advogam o estrito respeito da soberania dos Estados. O acesso a empréstimos de instituições financeiras ocidentais é condicionado ao cumprimento de determinados requisitos políticos, inclusive na definição de prioridades nas agendas nacionais de desenvolvimento. O acesso aos empréstimos chineses, por seu turno, é considerado mais amigável por ser uma questão de business as usual, ou seja, os Estados aplicam as verbas concedidas nos sectores que considerarem prioritários desde que cumpram com as suas obrigações na devolução das somas recebidas.

As lideranças africanas e os seus apoiantes acreditam que a relação com a China é reflexo de uma “cooperação win-win” (ganha-ganha) rumo à edificação de uma “comunidade de destino comum”. Nessa base, a expansão da China é interpretada como a emergência de uma “nova ordem económica mundial”, provavelmente equiparável àquela que era exigida pelos países do Terceiro Mundo nas décadas de 1970 e 1980.

No prisma dos detractores da ascensão da China na economia política global enquadram-se os conservadores, aqueles que são resistentes à mudança nas relações internacionais, que são apologistas da manutenção do status quo. Ou seja, os políticos ou analistas pró-ocidentais, que querem continuar a ver o Ocidente como o “guia” da economia política global, vêm em tudo que a China faz em Áfria uma ameaça ao poder ocidental. Portanto, eles consideram os empréstimos chineses como contrários às normas de convivência de uma sociedade “civilizada”, por supostamente não respeitarem os valores da democracia liberal e dos direitos humanos. Aliás, os detractores consideram que a “bondade” chienesa está a levar alguns países a um nível de endividamento tal que, eventualmente, os africanos podem ser “controlados” pelos chineses caso não sejam capazes de honrar com os seus compromissos em relação às dívidas.

Em função dos argumentos apresentados no parágrafo anterior, os detractores aconselham os africanos a consolidar mais as relações com os tradicionais parceiros do Ocidente, por estas garantirem “maior transparência” e respeito pelos direitos humanos. Aliás, segundo esta posição, se os africanos continuarem a apostar na China para resolver os seus problemas correm o risco de se tornarem dependentes daqueles.

No terceiro prisma, o dos cautelosos, situam-se aqueles que procuram encontrar os méritos e os deméritos dos dois anteriores prismas. Este prisma reconhece tanto os potenciais benefícios da consolidação das relações China-África, como também os riscos de uma eventual “colonização chinesa de África”. Por essa razão, os cautelos aconselham os africanos a receber os “presentes” chineses com cautela para, por um lado, alavancar o desenvolvimento do continente, ao mesmo tempo que, por outro, mitigam os efeitos negativos do referido “presente envenenado”.

A terminar este artigo, nos cautelosos pode dizer-se que se enquadram aqueles que consideram que a ascensão da China é benéfica para África. Porém, isso não significa que o continente africano deve abandonar ou marginalizar as suas relações com os tradicionais parceiros do Ocidente. O significado disto é que os “milhões de dólares chineses” são uma oportunidade para África não depender somente das instituições controladas pelo Ocidente. Portanto, o aparecimento de novos polos de poder económico, como a China ou outros, dá aos africanos uma acrescida “capacidade negocial” no relacionamento com os diferentes parceiros económicos para o acesso a financiamentos para as suas agendas de desenvolvimento.






Sem comentários: